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Uma história inacabada 1
 

Por Rodrigo Munari e Gabriela Ullrich.


Contraditorionópolis, era um povoado pacato naquele ano de 1820. Leste bem, era.
Cravado em um vale rodeado de belos morros, possuía as estações do ano bem definidas: no inverno fazia frio; no verão calor; no outono as folhas das árvores caíam; na primavera nasciam flores, tudo bem certinho.
A geografia do lugar era perfeita, a água limpa e abundante, as terras aráveis e férteis, bem como o sol e a chuva, que alternavam as suas presenças respeitosamente, fazendo das plantas e animais que ali viviam, seres saudáveis e potentes. Tudo se complementava, a engrenagem funcionava bem.
Ao redor do ano de 1700, chegaram vindos sabe-se lá de onde, os humanos. Filhotes, fêmeas e machos. Apaixonaram-se pelo lugar. Eles traziam na bagagem algumas ferramentas que usariam na construção das suas moradas, no preparo das suas lavouras, no corte das árvores, no feitio dos poços e na produção de coisas diversas. Traziam armas também.
Foi aí que a engrenagem sofreu seu primeiro solavanco, os humanos agiam como se não fizessem parte daquela estrutura ecológica, a relação era de apropriação e transformação.

Havia um bando que parecia ser mais especial, pois todos os outros humanos quando chegavam perto deles, se curvavam e faziam um gesto de reverência com os braços e mãos. O nome do humano macho que parecia ser o líder, era Rei ou Majestade, ou os dois.

Ele tinha ao seu lado um humano fêmea, a Rainha, que também era chamada de Majestade. Ambos, os Majestades, tinham uma ninhada de filhotes que eram chamados de príncipes e princesas, e cada um atendia por um apelido: Niburço, Nacleto, Nastácio, Nardete, Varlete e Chacrete, esta última, uma dançarina.
Os humanos organizaram-se em bandos chamados família, construíram casas, um templo onde realizavam uns rituais meio loucos, falavam com um ser que ninguém enxergava, e foram procriando, formando mais bandos, se espalhando pelo vale.
As coisas foram mudando ao longo dos 120 anos, mas, nada até agora fora tão impactante quanto o surto-pancadônico de janeiro.

O ano de 1820 entraria para a história de Contraditorionópolis.

Seria uma bactéria, um vírus, algum tipo de magia ou uma outra coisa desconhecida? Qual, que ou quem era o agente de toda aquela mudança?

Os dias passavam e mais pessoas adoeciam, ninguém conseguia frear aquele mal repentino que atingia a pequena cidade. As autoridades, chamadas de reis e rainhas, foram em busca de especialistas e encontraram, na Rússia, um cientista capaz de explicar o que estava acontecendo.

Ao chegar em Contraditorionópolis, o cientista detectou um vírus fatal e altamente contagioso que atingia todos, sem exceção nenhuma. Sem recursos ele não conseguiu descobrir uma cura. Aquilo preocupava as autoridades pois pessoas de suas famílias estavam adoecendo e aos poucos morrendo. Desesperadas, as autoridades procuraram ajuda. Uma pequena vila muito rica da Espanha, disponibilizou equipamentos e contribuiu com dinheiro para que o povoado de Contraditorionópolis enfrentasse esse vírus.

O cientista responsável pelas pesquisas conseguiu uma erva potente o suficiente para o tratamento dessa doença, porém ela estava escassa na vila. Os ricos, autoridades e seus demais familiares tinham preferência para o tratamento. A erva utilizada para a cura do vírus começou a faltar e aqueles que haviam restado, os pobres, ficaram sem tratamento. Aos poucos, foram morrendo e os pequenos bairros em que viviam, ficaram vazios. Os reis e rainhas não se importavam com aquela situação já que as pessoas que amavam estavam salvos.

Quando o vírus se acalmou no povoado, as autoridades perceberam que sem os pobres, suas mãos de obra baratas, nada mais fluía. Após essa trágica experiência em 1820, os reis e rainhas que sucederam o povoado jamais deixaram faltar qualquer coisa para seus trabalhadores.

A partir daquele ano as coisas mudaram, as pessoas estavam mais empáticas e solidárias. Nunca mais aconteceu algo que aquele povo unido não conseguisse superar.

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